domingo, 19 de dezembro de 2010

Xadrez

                                                            Pelo oxigênio que fere os pulmões.
Jazem doze dias que não escrevo e tudo que eu posso oferecer é um circo de palavras rolantes e extrínsecas e, aquele CD arranhado que repete o pior refrão, como foi meu dia hoje?
É preciso coerência de tema para escrever sobre seus sentimentos? Machucar em nome da arte, isso é válido? Falar sobre morte na literatura não vai te fazer morrer de verdade. Quando se pratica homicídio se morre duas vezes, alma e corpo. Não é um depressivo que vos fala, nem teorias aleatórias de uma  psicologia behaviorista  barata, culpo minha mão que de palhaça tateia cortantes palavras sobre meu corpo. Não se manda nos cinco sentidos, que fique bem claro.
Apago e escrevo apago e escrevo. Uma fermata de dores e delírios, não ficou bom, bom pra quem? Saberia tu analisar os sentimentos alheios? Tu  terias cicatrizante analises? Não discorde comigo leitor, nem sempre discordar o fará ter personalidade, discordas quando teu sentimento ferir o meu, e deixe que eu mesma te ofereça minhas mãos, não há algo mais perigoso e funesto que elas.
Sei que à maioria aqui prefere ouvir de mim contos, contos de penúria ou vezequando de um amor puro e universal. Contos, porque raios-X nenhum detecta enfermidade ou doenças nos ossos, os humanos não aceitam ver pelos próprios olhos suas almas podres, sabonetes são usados para disfarçar o odor do corpo virgem. Vivemos na sociedade do brio, que o amor próprio lubrifica os olhos. Morreremos, pois não sabemos diferenciar problemas cardíacos com os sentimentos de paixão, deixes tu leitor de se apaixonar por seus pés, olhar para o lado é a solução para não morrer atropelado.
Não seria mais fácil se quando quiséssemos entrar em casa, chorássemos, latíssemos, arranhássemos nossas patas na porta de madeira, no entanto fazemos de conta que não importa, o nosso orgulho é um ponto do alfinete. Só se morre de orgulho se você o engolir. Somos tão parecidos com os nômades, somos nômades; chegamos à  um local rico em verdes, natureza suntuosa, lagos imaculados, absorvemos tudo, nos  lambuzamos, e depois? Fugimos e  nos refugiamos em outro local, com outro lago, frutas, peixes e vida. Nunca vamos aprender a cuidar da terra e fixar nossos pés nela. Fomos criados assim, assim vamos criar, ou vamos destruir.
Quantos corpos você já usou para se salvar? Quantas naturezas você sugou, como hirudínea? E quantos bebês você desmamou antes dos dois anos? É que o passado e o presente são interligados sim, braço esquerdo, braço direito, o coração os une, veias os une, não feche seus olhos para isso, leitor.
Estratagemas.

sábado, 20 de novembro de 2010

Por qual não vale um conto.

Contrair emoção, regatar os amores ilimitados de mendigos que veze quando precisam de pão e leite. Vou contraindo minhas unhas dobrando os dedos como se fosse socar alguém com as duas mãos, às veias do pulso com a força que fiz quase pularam para fora, minhas unhas  perfuram a  parte central das minhas mãos, no local que  ficam linhas da vida. Tentei apagar meu destino, molde do destino, o que queira chamar. Fechei minhas pálpebras, meus seios quentes e maternais jorraram leite, leite de um feto abortado, jorrando à  falta da fome. Corri a árdua travessia da porta para o sofá, que me fez relembrar uma navegante na maré vermelha, talvez seja aquelas toxinas liberadas, fico pensando, tudo tende a sangrar, e tudo que sangra existe um  culpado por tal ato. Proliferação, planctônicas. Leite materno. Ciclo embrionário, morto pelo enforcamento de um cordão umbilical.
Morte? Fascínio de escritores, musa da filosofia, falamos de morte, porque amor é limitado. E porque todos nós temos sede de existência, sede de amor passa com água. Sede de vida? Sede de vida não passa, temos medo da morte só depois que ganhamos à vida. Mas, nascemos de morte. Sei que é uma idéia assustadora. Tenho insetos no meu cérebro, gafanhotos e vaga lumes. Sou uma mulher que retorna tragicamente para vida, ou, sou uma mulher substituta, substituo dores de homens pelo fascínio do meu corpo, substituo suas frustrações por anarquismo psicológico, vou me substituindo, condensando, sublimando. Porque como a cobra, depois de certo tempo com o mesmo couro, ela começa a feder.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Abate

     No fim da estrada, sempre nos deparamos com decisões, entre desligar ou não o oxigênio. Viste que a galinha, essa nasceu com o destino entrelaçado  na morte. Viste que a morte, só a morte, é uma maneira de dormir sem ser incomodado.
Já é sandice achar que galinha tem alma, então, não existe nada mais perto da morte que uma galinha.
     A destreza com que ela vai andando pelo “corredor”, as mãos que a sufoca das mesmas delicia-se dela.
Emendando seus pés finos para não tentar voar, outra utopia de galinha.
Cravando-lhe a mão no pescoço, ela se debate, se contorce, late, grunhi, surta e entorpece, zangando-se. O cérebro da galinha, liberando um tipo de endorfina, que não é dor fina, solta a língua para fora. Espírito de sobrevivência. E depois de tantos séculos, burras galinhas não criaram nenhum tipo de aptidão para se salvar da morte.
     Abastada, incompleta, incrédula, servida como mingau.
Já nasce suicida, só por nascer galinha, e como um ser de tal ignorância não tem o conhecimento de sua própria morte.
Joga-se o milho, limpa-se o celeiro, choca-se  ovos, cisca suas dores de galinha apagando a crucificação no terreiro baldio, deita-se com o galo, divide-o com outras marcadas pelo mesmo destino e talvez, chore.
Aniquilação absoluta, primeiro retira a camada de penas, deixando-a nua, porque ela é pura vontade de vida, água quente, borbulhando, joga-se em cima do cadáver, deixando-o limpo, purificando a alma de quem aceitou a bigamia, mutilando-a corte por corte, dividindo os pedaços para serem servidos com ou sem farinha.
   É quase escasso o que se imacula, nem é atrito, talvez os narcóticos neurolépticos salvem-na.


  “Edite, bibite, post mortem nulla voluptas”.



*"Comei, bebei, depois da morte não há prazer".

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Pinhos


De longe vi o verde, plantado como cacto
Esparramei a correr, montagem, fostes uma miragem
Mas o verde  já estava sobre o talo
Comia meu cérebro e fazia pose à margem.

 Doía o verde do Pinho
O Pinho doía de verde.
Talvez  porque a terra é seca
O Pinho doía de sede.


O pinho irritado teima,
Como o vinho teima em ter cor
Vi que debaixo do vinho
Tinha pinho de um leitor.

És Pinhos
Es pinhos
Espinhos.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Glicose



É  de tal ingenuidade  a vontade de escrever do homem, e a minha também, mostrando-se despido e frágil para qualquer um que tenha olhos. Derramando  sobre o leitor uma podridão dos seus segredos pungentes,  fazendo pose, divulgando suas formas encurvas de ser humano, que se ilude com o próprio veneno criado. Que é escravizado, açoitado, assombrado por sua própria vontade de comer letras.

Comecei a escrever tão depressa que talvez meus pensamentos não consigam acompanhar minhas cartas. Minha caligrafia está feia quase ilegível, eu estou defronte a uma vela que ilumina o papel deixando-o de uma cor amarelada, estou vazia de uma forma como se tivesse provocado todos os órgãos do meu corpo, não sei como, estou viva. Viva?Talvez só esteja dormente, estou dormente, todo meu corpo, junto com minha alma. A vela está derretendo como se estivesse chorando, as lágrimas dela queimam, queimam por determinados segundos, depois solidificam na pele e gruda, é uma dor confortável  que dura pouco tempo, eu poderia passar minha vida pingando lágrimas de vela sobre  meu corpo. Está tudo escuro e eu peço baixo para poder me camuflar no bruno dessa noite, agora meu ser submete-se a uma presença estranha. Talvez ele não me veja no escuro, e vá embora levando suas dores que não são poucas e ele insiste em  mostrar, em cavar isso em minhas córneas, como uma aplicação de anestesia. Eu fico zonza e ele pode deleitar-se do meu sangue, sendo único alimento que o satisfaz, e de tantas vezes ao dia o deixei saciar, que acabei ficando anêmica.  Meu sangue agora é tão escasso que em sua próxima refeição me levará ao túmulo.
    Eu que por muitas vezes pertenci à hecatombe, e suicidei-me, hoje sou covarde e venero minha covardia como um gótico veneraria o sepulcro. Tenho granitos espalhados por toda minha alcova e não posso mexer-me muito, mumificação e os esparadrapos talvez cubra minhas feridas abertas, que não conhecem o termo “cicatrizar”. Leio pequenos versículos dos meus pensamentos, pois ao contrário de outros,  meus pensamentos não são feitos de imagens e sim de letras, elas voejam e embaralham-se e eu fico decifrando, não como um caça palavra, porque é  à palavra que me caça. Vejo às letras e nelas aparecem  hematomas, não entendo, franzo minhas sobrancelhas, mas continuo sem entender. Talvez esteja sonhando, belisco-me, não sinto, agora parece mais confuso, estou dormindo?Acorde, acorde, nada, passo as unhas fortemente pela minha epiderme, continuo sem sentir, lembro-me que estou dormente, minha alma e meu corpo que é minha carne, então comecei a contorcer meu esqueleto tentando fazer com que um osso quebre, não sinto, não sinto, quem foi o assassino?Não, não eu estou viva. E vejo, é hexágono, hexágono de 32 lados. Acordei.  Agora pareço realmente sonhando, estou em um bloco de carnaval e às pessoas gritam e jogam confetes, algumas tropicam ,jogam seus ombros contra os meus. O som ecoa por toda parte, ecoa por todos os corpos, e todos cantam uma música diferente. Eu tenho a leve sensação de hibernar, não sei como, mas é essa a sensação que estou sentindo, uma era glacial e os sorrisos começam a congelar-se, à mulata que requebrava os quadris, cessa em uma posição de estátua grega, e o homem do pandeiro ao seu lado. E tudo se torna hirto, uma desordem imóvel. E quando alguém vem me tocar, eu acordo e  grito. Acho que acordei todo mundo, verifico e vejo que estão todos dormindo, talvez tenha gritado no sonho e acordei com o barulho do próprio. Nada que esteja sendo lido e escrito nesse momento vai  ter sentido, pois é difícil saber se ainda estou no pesadelo, não sei se o que estou escrevendo vai virar concreto, ou amanhã vou procurar esse papel e descobrir minhas letras fantasiosas, que tudo não passou de um sonho. É uma sensação de está  abortando seu próprio corpo. De que nada te pertencesse, ou de que tudo passa a te pertencer, você fica lubrificado e começa a se debater em uma sala branca.
E meu devaneio é ser. Então, quero por essa noite tomar posse do meu cordão umbilical, quero à  graça de ser um embrião, de ser carregada na barriga de alguém. De poder chutar quando tenho vontade, e receber um carinho por isso, e que a pessoa sorria porque é um sinal de vida. Quero esperar o alimento chegar depois de mastigado para que eu não engasgue. Espero alguém que me ame sem conhecer meu rosto, que se sinta feliz quando eu a fizer enjoar e vomitar 3 vezes ao dia, e que não reclame disso mais uma vez, e  se sinta feliz. Quero ser esperado pelo leite que me alimentará durante três anos e que eu possa sentir-me íntima dos seus seios, até que comece andar sozinha. E quando eu  estiver já sendo um incomodo que aconteça o parto, mas que com isso ela não me tire da sua vida, mas só exista à separação da barriga.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Navegar poesias



És minha
Vontade de rimar
Rimo tráfego aéreo
Com tempestades em alto mar.


Feudo

    Cuidar do corpo nunca foi tão preciso e precioso, amontoamos perfumes franceses e esquecemos-nos de banhar diariamente nossas almas. Importamos maquiagens e como reboco cimentado desenhamos sorrisos de 24 horas e escondemos a idade.

Criamos deformidades!

     Malhamos até ficar com o corpo esculpido criando montanhas nos braços. Esquecemos de colocar nosso cérebro em uma esteira.
            Um corpo esculpido um cérebro entupido.

As modelos que passam na passarela não vendem só a roupa da grife italiana, vendem remédios, inibidores de fome e shakes diets, desfilam com seus vestidos em forma de comprimidos, última moda na UTI.
 
    Comparar um garoto pobre do Zimbábue, e uma garota rica de Milão. Os dois pesam o mesmo. Só que uma vomita. E outro come o vomito do chão.

Nunca foi tão difícil distinguir um nariz que respira de um  que “aspira”. E nunca foi tão fácil concordar com a corda que vai nos enforcar.

                  Temos escravizado nosso corpo para garantir uma silhueta no fim do dia.
Corrigimos falhas de ter nascido humanos, porque essas só são aceitas no caráter, falhas no corpo o espelho reflete.
              E no final reverenciamos o nosso Senhor bisturi de cada dia que nos tira hoje.

sábado, 18 de setembro de 2010

Cantiga de despindo-se.





Eis cá meu arlequim
Devoravas pétalas do meu jasmim

Foi-se embora cantando aos prantos
Eu,regozijando,regozijando.

Da tua pele senti  o sabor do amor
E quando me tocava ao corpo fervia a vapor.

Da minh’alma tu te alimentaste
Agora cospes, e pede-me chaves.

Tu que dormias sobre meu corpo nu
Cegara teus olhos aquele belo mar azul?

Meu broto arlequim
Porque disseras que morrias por mim?

Cá eu ébria pelo vinho teu
Agora vivo sóbria, faço-me ateu.

Meus lábios que dantes eram molhados
Vivem cá agora em sertões castigados.

    Aflita, fiz gestos que parecem gritos
E o que voltou foi o eco da minha voz, maldito.

O hálito da sua boca ainda esquenta minhas veias
Como os pés no inverno, precisam daquelas meias.


Nos seus cabelos, estou trançada
Calve-se, e eu seguirei estrada.


Este peito que se acendia
Hoje vive a uma vela vadia


Não se lembras do meu vestido vermelho?
Que tu nas noites, despia ao desespero


Da gargalhada
Fez-se pranto.
Do teu amor
Um canto.
Das marcas
Cascas.
Das asas
Harpas.

Eu fui perguntar para os bêbados na rua
Onde estarão tuas doces formas cruas?


Quem sabe à noite
O tronco não tenha açoite.


segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Sem verba


    Veja!Extra!Caras!Grita o menino com o jornal na mão, vendendo informação com a barriga seca de pão. As pessoas que passam, já não sabem ler, e mesmo que soubessem não perderiam seu tempo, lindo, tempo. Não existe tempo para ler nem para escrever, como está seu tempo?
"Nublado". E por falar em chuva, vou pegar minhas roupas no varal. Na volta com as roupas na mão, vi que o sol já estava voltando. Quem sabe se eu lesse o jornal...
Olhando tudo em minha volta,vi,veja a organização construída sobre o alicerce da monstruosa desordem. Veja o relógio.
Tic-tac. Tic-toc.
Faz seu trabalho. Não pode parar. Então o homem cria à bateria, para a bateria.
Servos ao relógio. Quem falou que à ditadura acabou?
Vamos lá, cronometrados para sermos felizes.
Teoria do caos?Da relatividade?Não, essa é a teoria dos ponteiros.
Donde o maior domina o menor, e os segundos pintam a cara protestando.
24, vinte e quatro horas, para sentir o orgasmo fervilhar as veias e depois viramos e dormimos.
8 horas é o ideal, dizem os “espécie-a-listas”, oito horas nos dão para recarregar as frustrações de soldados em guerra civil, ou quem sabe tudo isso não passa de um canil. E para um bom sonhador oito horas não bastam.
06h00minhocas. Alarme grita, sorriso é alegria.
Ao acordar, viramos espermatozóides killers, e tudo se relaciona em fecundar um óvulo, correr, correr, fecundar. E se algo der errado?Estima-se que 60% da população sofrem de aborto espontâneo.


   Repetir o inquérito, reformar a casa, redesenhar a fossa.


   E quem sabe uma autogamia, reviver, viver, ver, vi. Não, cegos por uma poluição já não se vê mais nada. Só que o Sir. Hipocre dizia: que prefere se hospedar na UTI(Unidade de temor indeterminável)a viver na epidemia de cegueira. E quem sabe o veterinário, (médico)venha visitá-lo hoje.
A bolsa caiu. Cuidado com o ladrão. Vamos comprar!Comprar!O mercado de 24 horas está aberto. Que coincidência. Nua, pousando a moscas e com a validade violada tem algo que nos chama atenção, o presunto chama-se verdade porque “saúde” este já existe. Nós compramos e depois revendemos com 50% de desconto, parcelamos a felicidade em 12 meses, porque dívida é felicidade. Então, que ela possa durar 2 semestres.
Somos orientados a vencer em uma disputa de anônimos. Ou, você sabe quem está sentado à sua direita?
      É nessa arraia-miúda que criamos nossas proles, que se tornarão grandes ateus, a seus, não a nossos.Vou servir meu chá das quatro e comemorar o bélico perdido.
Porque “faça amor não faça guerra”. Oh, Marcuse eles não sabem o que fazem.
Desculpa, não ressuscitarei no terceiro dia.

domingo, 5 de setembro de 2010

Eva



Gosto de maça carmesim
De um lírio branco cai à cor do crucificado
De joelhos pedes perdão defronte ao calvário.

      A mulher grita
     És pecadora
    És adúltera
    És expulsa
    És mulher.

Na carne cicatrizes de desejos reprovados
Camuflam-se em bruma alma
Cale-se, perante teu Deus!
Ajoelhe-se, defronte ao Diabo.
E o ventre jorra sangue
O sangue do suicídio
Entre o cárcere do jardim florido.
Pecas, para sentir o sabor da faca enfiada ao espasmo.


   És mulher sem ventre
   És sem alma
  És fujona
  Escrava.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Passos do Sertão

No sertão os pés descalços, pisam
No chão quente.
Pobre coração
Pulsa frio.
O lampião dá-se    
Adeus.
O cavaco chora.
Em comboio, chora.   
A mulher segurando no peito
Esperando o coração acalentar.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O tráfego da rosa


       Marchais pelados como os anjos faziam, na época em que  suas asas ainda eram brancas, pois não existia a tal da poluição. Voltastes a me ver como um erro acrobático, como um pôr-do-sol ao  meio dia. E essa lua que hoje canta, de mim só se ouve os berros, talvez se tu foste um maestro lua, eu poderia ouvistes. E por que berras para mim?Não posso olhar-te defronte, pois é insuportável ver-te como uma amante. Lua, explica-me como consegue ser tinhosa, não tem vergonha de mostra-se para todos?De ser dada aos amantes, de ser cobiçada pelos sonhadores?

      Lua faz-se cheia, viçosa, para os homens. Minguante para as mulheres enfeitadas de amor. Crescente para os casais gozando em um quarto, ou à espreita da janela. A nova é o parto, envolvida em um cordão umbilical, fazendo-a  choramingar, esperando pelo leite materno.
      Quem é você lua?Por que se faz, refaz, desfaz?Não sabes que de ti que tenho medo, e tu atrevendo-se camuflar não me resta mais nada  do que temer olhar para ti.

      Então me veja como uma flor perdida, ou quem sabe você me acha, leitor. Não trafegue por entre às roseiras da espécie que é minha flor, pois tu podes encontrar tempestades, e eu não moverei minhas pétalas para te salvar. Não espere seu barco naufragar para sair do bote, essas águas que me regam, falsas, matam-me mais um amante.

   E nessas idas e vindas das navegações, perdeu-se uma flor sem cor, não era branca, era incolor. Joguem essas âncoras parem esse navio, a rosa que era acromática fugiu. E capitão do navio grita: ”Procurem à rosa, se achar 20 vinténs vou dar”.

     Vasculharam o navio, e nada da flor, os homens negros, escravos, buscavam pela rosa. Como cachorros famintos buscavam por comida. Gritavam, e jogaram os barris de vinho, reviravam os quartos, e nada daquela flor. Alguns se jogavam do navio, e caiam no mar. Congelados, morriam com seus lábios tremidos, e suas mãos enrugadas, até o sangue fazer-se sólido, criando um cemitério em alto mar. O mar tomava-se outra cor. Os cadáveres negros, banhados, bailavam  com o andar das ondas. E os corpos desciam ao fundo do oceano.
 O Capitão desesperado tornou a gritar: ”Quem achar à flor, vou alforriar”.   
         E os negros desesperados, tropeçaram-se uns nos outros, e a arruaça estava feita. Confundiram-se uma flor roxa com a flor procurada, e guerrearam como animais selvagens, alguns estavam no chão, outros incansáveis ainda juravam ter visto à flor na navegação. E os bramidos dos negros com passar dos tempos, tornavam-se mais forte. Criavam alianças, comparsas, e inimigos de longa data, acusações eram feitas, cúmplices eram “traídos”. E nada da rosa ser encontrada. À noite já aparecia, e os negros detetives, cansados, mortos da batalha se rendendo, sem esperanças.

       E foi então que um deles viu: A rosa pegava um bote, a caminho para o Brasil.  

sábado, 14 de agosto de 2010

Onde foi parar o título?


Estou dispersa, frígida, e não consigo fazer com que essas palavras soem sentido. Não, elas não soaram, pois elas já não têm vozes, camuflam-se  diante uma escuridão que meu corpo emite.
Vejo-me diante de poluição de pessoas, donde esse lixo não inorgânico e não reciclável é jogado na frente de minha janela. Essa imundice de lixo humano do qual já não existe coleta, abarrotara minha casa, me deixando com todos os destroços que compõe essa sujidade.
Eu, engolindo esse ar poluído, esse ambiente detestável, essa lagoa que de longe se vê os corpos que  assemelham  a urubus debelados. Urubus espírito do lixão humano.
Não culpo esses humanos, culpa minha também, deixo-me sujar de suas poluições, e gosto, sinto que fazendo isso me aproximo do que chamo de “escape humano”.

Fico febril.

 Essa contorção do meu corpo quando estou me afundando em um oceano negro, deveria ser explicada pela medicina. Fico eu  e meu corpo contorcido, nenhuma explicação. E o joelho que fica perto coração sentindo a pulsação cada vez mais mórbida, são os braços que na mesma posição, segura os pés para que eles não possam fugir daquele lugar enfermo do qual você se encontra. Você se encurta para que a dor  possa se encurta junto com seu corpo. Essa é a posição do feto.

Deite-me em cima de espinhos para que a dor passe a ser física, e para que no corredor do hospital eu possa-me sentir segura, sabendo que lá alguém cuidara de minhas feridas. Onde me servirão  uma sopa quente.

Isso acontecerá freqüentemente, sinto que boa parte de mim, se foi. A boa parte de mim se foi. Essas orações, que é assim que chamo todas essas coisas que de mim saem, elas compunham-se de um vestido vermelho, mofado e rasgado, de dama confessa na igreja. Padre onde você está?Preciso hoje confessar-me. Cometi,e se não cometi,cometerei o pior adultério, estou traindo a mim mesma. Engano-me, e olho para o espelho com ar de cafajeste, não peço perdão por meus atos, muito menos pelo adultério, nem é para pedir perdão que estou aqui. Não sei por que estou. Só estou.

Sinal da cruz.

Amém.

Tenho que partir. E o caminho é longo. Deixe minhas palavras assim, sem começo nem fim, pois são palavras, não precisam de sentido para existir, elas só existem.

Amém...

domingo, 8 de agosto de 2010

Smoking



Entre tardes e uma neblina de longe branca de perto negra.
Amantes em um quarto dormem não se arrependem crédulos de um gozo quase uivante, então fazem do cobertor seu álibi do ato obsceno. Os corpos já frígidos camuflavam-se entre as latitudes de pensamentos indigestos. 


O suor ainda estridente,falava,gritava como se pudesse confessar o adultério. E as palavras saíam candentes na forma de água que se ferve a lenha. Então enquanto sentia-se a brasa queimar-los a cama de madeira, febris, podiam tocar a última faísca daquele fogo de outrora.


Desnuda,  seu corpo de pequeno porte ladrilhava cicatrizes de atos ferozes, e noites com gosto de ébrio. Seus lábios rigidamente bem desenhados ainda sentiam o sabor do vinho que descia sobre o deleite de uma chaminé eufórica. Sentia-se evaporar todo pecado omitido, as maças vermelhavam todas as mobilhas do quarto. E os escombros rangiam em pós-gozo.


Ele tinha os braços esculpidos e fortes. Fazia leitura do corpo da mulher deitada à sua direita. Ele escrevia como um poeta e não manuseava lápis, cravava as palavras no corpo que pulsava sangue, no corpo de sua amante. E nada do que estava escrito poderia ser apagado, ou reescrito, era poesia eterna, que o autor era personagem de parágrafos maus descritos, era à ida da poesia sem volta, consumada. Sabendo que suas escritas ganharam vida própria, viu-se  a titubear no sono.
Viam-se as cinzas que consumiam seus  corpos, a neblina já desaparecia, e já se sentia o aroma do café filtrado no vizinho.

Acordados, defronte um ao outro, olho negro olho claro, mas o mesmo olhar de pecado. Ele ainda mostrou um breve canto de sorriso, satisfeito. Ela tinha um olhar longe aquele que ele ditou certa vez como: ”Esse seu olhar é longe do tipo que me atravessa alma”. Ainda deu para escutar o nó desfazendo-se  na garganta dela. Se dissesses que o amava poderia perdê-lo.

 -Veja só onde fui parar. Ela declamou.
 -Veja onde estamos,ele respondeu,vestindo-se um Smoking azul marinho. Fechando a porta.
 -Vai ficar tudo bem?
-Sim, bem, tudo bem.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Ao som de um último acorde.



“Música, o que é música além de um arranjo? De um violão bem afinado, e um maestro regendo uma orquestra”?
“E o que é o som, se não uma freqüência medida em decibéis”?
Essas frases usadas por alguns de meus amigos reforçaram o meu íntimo motivo de escrever, sobre música e da forma ambígua que ela age sobre o meu corpo, meu espírito, sobre o externo, que acabaria por vez, se tornando interno.

“O que diferencia  música de um som? O ouvinte”.

Enquanto entrava em um restaurante, escutei várias vozes, agudas, graves, finas, de homens, mulheres, e crianças. O barulho fazia-se mais forte enquanto me aproximava da mesa onde sentaria, eu tentava identificar de onde saía cada som, impossível. No começo as vozes mais graves chegavam primeiro aos meus ouvidos, depois as risadas estridentes, e no fundo,como se fosse o fundo de uma tela na qual a paisagem seria o segundo plano,vozes tímidas, quase instáveis. E se não fosse um som para ser “apreciado” de maneira individual?Parei, como se por dois segundos pudesse silenciar todos. Comecei a notar às vozes de forma coletiva. De fato o barulho era perturbador, era como se o quadro por um instante ganhasse todos os tipos de paisagens nos fundos da tela.
E depois de certo tempo, vi que o som começava  a agrupar-se. Tanto que agora eu era que estava no segundo plano da tela.

“Sou um homem que faz música com o cérebro”.

Pensei certa vez como uma pessoa que sofre de afasia consegue compor?Como a música age com relação ao cérebro, e nossos sentidos?A pergunta é: A música é capaz de mudar nossos sentidos sensoriais?Se me dissessem que sim, diria: Então a use com pessoas que sofrem de amnésia.
Interromperei, para a passagem de um texto.
Estava eu e o porto, o mar e o céu que contrastavam da mesma cor, azul marinho. Notei que olhando para o mar e para o céu não conseguiria distinguir-los, só viria um breu, tudo era escuro fazendo alusão para o nada, tanto que eles pareciam um só. Eu não entendia como uma pessoa passara seu tempo olhando para aquela dimensão. A visão naquele momento era falha. E por um instante fechando os olhos, comecei a ter a primeira percepção de onde se encontrava o mar, podendo finalmente separá-lo através do som. A onda que tinha timbre forte crescente, enquanto batia na ponte fazia tremer, titubear, e as minhas pernas logo ganharam o compasso emitido pelo tom, através da vibração que a onda causava.

“A música vai dando movimento ao corpo, o corpo vai virando música”.

“Feche seus  olhos, veja com seus ouvidos”.

Na noite distinguimos imagens através dos sons. Um choro de um bebê, um barulho de gato, um pingo de chuva, todas as coisas que não conseguimos ver, ouvimos conscientes ou inconscientes, e isso também se torna música. Quando a rua está vazia, não necessariamente precisamos ver, mas teríamos que ouvir, para saber quem vem, ou o que vem.

 “Um breve silêncio: Música”.

Os passarinhos dessa vez não cantaram. A chuva não fez o barulho que eu esperei. As palavras já não eram satisfatórias. Restou-me um breve silêncio, e um pequeno acorde musical.


"O homem cria música, o homem escuta sua criação, o homem se torna cria-tura."

quinta-feira, 29 de julho de 2010

A noite de Oliva-verde

                                                                                                                                                                              Na noite do arlequim na janela.

Um barulho forte combinou com abrir dos meus olhos, a janela que não costumava ser aberta, naquela noite em especial estava, mas como?Zéfiros  cobriam meu quarto, trazendo uma bela canção, levando-me a um sonho. O de sempre: Minhas visitas a um jardim, dessa vez o jardim estava coberto de boninas e lírios, e outras rosas que faziam um efeito bordô, no sonho eu deveria ter doze anos, corria como se estivesse livre, eu estava. À liberdade que falta na vida encontro nos sonhos.
Eu estava sorrindo, um sorriso azul celeste, minha pequenez e um laço nos cabelos era um traje perfeito para uma festa no campo. Oh, e como eu estava feliz, nunca  tinha me sentindo assim. Não era aquela  felicidade quando se ganha algo, ou quando alguém aceita o pedido de casamento, era felicidade gratuita, sem motivos, ou melhor,  o único motivo se encontrava no vento que eu sentia no rosto conforme corria cada vez mais rápido.
O barulho dessa vez foi mais intenso, mas não foi da janela, eu acordei já assustada, alcei, os meus pés pisavam leves e devagar no chão arranhado, passos miúdos, o medo crescia cada vez que eu ficava mais perto da janela. O relógio fazia um barulho estridente, eu poderia voltar para a cama, ou gritar por socorro, mas seria uma ofensa, ofensa em grau supremo.
Escutei o barulho de novo, fiquei parada, na divisa entre a janela e a porta do meu quarto. E se fosse alguém?Seria perigoso?Mas se não fosse nada?O que eu estava esperando ser?Ou melhor, eu estava o esperando?
Um cetim branco entrou no quarto bailado pelo vento, os meus olhos bailavam com o cetim, ele era branco e afável, parecia com aqueles que se ganha em enxoval, até que delicadamente ele caiu no chão. Pensei em apanhá-lo, mas ele ficaria ali de uma maneira ou de outra. Então me apressei para ver o que estava lá fora. Chegando perto da janela, e apoiando minhas mãos, pude sentir uma friagem que ironicamente “queimava” meu corpo.
A rua estava em silêncio, e não se via nada além dos gatos que reviravam os lixos. Os galhos de uma árvore em frente minha janela, fazia desenhos com suas sombras no chão aterrorizantes. Pensei em falar, mas meu medo agora era de assustar  “A criatura”, parada olhava como se soubesse que teria alguma coisa de especial naquela árvore. Passado alguns minutos, eu já estava desistindo. E de novo o barulho, acompanhado por um “ai”, e no instante seguinte, uma imagem.
Meus olhos fixos na árvore, eu não tinha medo, nas sombras eu ainda tentava descobrir o que era e meu coração palpitava,  batia sem arranjos, distorcendo a música. Ele chegou mais perto, quase um galho de distância. Olhando-me, seus olhos me lembravam aconchego, e um pouco de ternura, ele chegava mais perto tão perto que eu pude ver seus ferimentos. A sensação de ter vivido aquilo antes me incomodava.
Esticando minhas mãos, para que ele pudesse entender que não precisaria temer. Ele hesitou voltando para trás, com medo talvez, pois seu olhar tinha mudado. Eu não o machucaria, continuei com a mão esticada, ele se aproximava devagar, astuto, e de uma maneira faceta cheirou minhas mãos, tentando descobrir se eu mostrava perigo, ou medo, senti sua respiração em minhas mãos.
Se apoiando em mim, ele entrou no meu quarto, tinha tantos machucados, mas sua pele era a mais pura que eu já havia tocado antes. Ele brincava com meus cabelos, enquanto eu descobria mais alguns machucados. Ele era quase tão humano quanto eu podendo sangrar, mas era tão inocente quanto um querubim, pois não reclamava dos seus ferimentos.
Queria eu entender que criatura era aquela, e o trouxe ela para mim, ele tão lindo quanto às rosas do meu sonho, e aquele sorriso do sonho, eu pude sentir ele pela primeira vez enquanto não estava dormindo. Então eu desejei que ali fosse sua última parada.
Ele estava sonolento, os seus olhos eclipsados. Os ferimentos tão meus quanto dele, pois enquanto eu cuidava das suas dores, me sentia parte delas. Eu ainda não sabia seu nome. Nem de onde veio, não sabia aonde queria ir, se sentia fome, ou dormia  nas noites, talvez  sentisse frio no inverno, ou teria medo de escuro, se  gostava de rosas,  não gostava de calor, não sabia se tinha sonhos, ou pesadelos. Tudo que eu sabia era que sua pele era confortável, e enquanto ele tentava dormir, franzia seu rosto.
Eu só queria poder senti-lo, e queria que ele não fosse embora  depois que  seus machucados estivessem  curados. Pois é divina essa criatura sem nome, que tem braços sangrando descobertos e cravados, quando eu vi que nas suas costas estava escrito “Arlequim”. Será seu nome?
“Então estava eu velando o sono de um arlequim”.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

A noite de Oliva-verde -03 parte-

                                                                                               Cartas para um leitor...

Veja o galo cantar, querubins trazendo meus sonhos. Querubins marchem!Sete dias, e as cicatrizes ainda enfadam  meu corpo. E esse é um corpo desacostumado a receber querubins, que na sua presença sente dor. Essa nova pele, tão difícil de encaixar. Achem as peças do quebra-cabeça, ache a parte do lado direito. Mas querubins voltem!Voltem e voejem perto de mim.
Perdoe-me, esse novo corpo parece não gostar de palavras, ele ainda é bruto. Paralisia de letras?E eu já não consigo mostrar-lhe imagens. Darei-te meu olho, minha córnea, veja o que eu vejo, as pupilas estão se dilatando e não é instinto, é metamorfose. Quando as pupilas se dilatam é porque estamos no escuro, esse é meu escuro eterno.
“Meu Deus, queria que tu me ouvisses agora, sou uma mulher e desespero, por isso peço que não me dê às costas. Hoje te farei uma oração, pelo menos é o que eu sei sobre ela.”
Essas palavras são  empoeiradas, e o papel já está ficando amarelado. Como elas não largam meu corpo?Tem tamanha posse sobre mim, quase uma amante. Posse, aquela que a ostra tem sobre a pérola, que guarda. Ostra tem posse sobre a pérola?Ou a pérola tem posse sobre a ostra?
Isso é fé?Ou é o primeiro sinal de luz que encontrei e estou seguindo. Força, força tenho força, mas já não a quero. Pois ela exige a guerra e um dos lados tem que levantar espadas!Correr, gritar, levantar espadas!
Guerra que os dois lados perdem, de cadáveres no chão, e depois catalogamos em calendário para comemorar um feriado. Minha guerra é comigo e contra meu louva-a-deus, inseto cuja finalidade está no nome.
Tudo que hoje escrevo me aparenta ser igual, um monótono, uma idéia fixa, quase uma obsessão de te manter dentro de mim, de te manter informado sobre minha morte diária. E te direi mais, nenhuma dependência é pior que essa, pois é dependência consciente, quero isso, vício da dependência.
Então por favor, fique...
Interrompi a frase que iria ser dita, pois vi um medo. Não sei se conseguirei deixar claro, talvez não queira. Mas vou tentar: ”Quando ama o que se caça"? Estabilidade. Sabe quem é o inimigo da estabilidade? O destino, e é dele que tenho medo. O destino é um grande escuro, um salto para o nada, você não pode esperar que o destino queira se encarregar dos seus sentimentos, muito menos que ele te leve a algum lugar. Porque você quer ficar, e não pode deixar ninguém se encarregar disso. Porque isso é seu. E  você vê meu segundo medo. O medo de deixar isso nas mãos alheias, certas ou erradas, são mãos alheias, tenho medo, que quebrem,sujem,que rasguem,tenho medo que sintam, porque se sentirem vão descobrir o quanto é indigesto. E se você tentar engolir verá que é veneno, o mais doce veneno humano, mas que no paladar de outro se transforma  e chega a ser áspero, não digo que morrerás, mas se quer ter uma experiência de “quase morte”  leia, e me sinta. Carne crua, e um pouco de reencarnação.
Você sabe por que falei em indigestão?Pelos meus pecados, que não são poucos. E se tentar ficar aqui, será cúmplice, logo se lambuzara de todas as minhas sujeiras, fazendo parte assim de uma alma poluída, talvez não você não queira fazer parte disso. Mas se ficar desculpe-me,  começarei  te sujeitar a isso. Seus pincéis azuis serão quebrados, e eu vou te obrigar a pintar de cinza. Espero que goste de cinza. Espero que goste de permanecer aqui. Eu não gosto, por isso sempre procuro por o meu “outro”. Esse outro “eu” que por várias vezes é minha válvula de escape, esse outro por qual eu me afogo todos os dias, e pelo qual tento parecer sem vida só para que ele me dê um pouco da sua. Esse é meu segundo rosto, aquele que eu busco no espelho, aquele que é intruso, mas parece pertencer a mim, mais do que eu mesma.
 Em cartas ao leitor é assim: “Jogatina de dados e mulher torcendo para que  número seja sempre seis”.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

A noite de Oliva-verde Parte 2

                                                                                                                O pacto


É quase de manhã, o sol ainda não brotou, é 
noite-clara, com perfume que só olfatos mais aguçados conseguem sentir seu cheiro. Tenho leves lapsos de sonhos, sonhos?Ou variação de pensamento?Até onde acaba o pensamento e começa um sonho?Às vezes acho que sonhos não existem não aqueles de forma automática que acontecem do nada. ”Sonhos de loteria”. Que aparecem números para serem apostados com esperança. Creio que sonhos são apenas pensamentos diários, quando não temos álibis,”sonhamos”. Sonho é desperdício, pois sempre acordaremos na posição que paramos com o real.
Estou com um pouco de dor, dor-jejunal. Não me falta fome, pois a tenho, o que me falta é coragem, sendo que a mesa não estar posta, e eu teria que preparar o desjejum com minhas próprias mãos. Por isso fico deitada, esperando a fome passar.
Estou crua, e o vento bate em minhas costas que se arrepiam. Estou crua, crua de sentimentos. Não se confunda, pois não é vazio. Vazio é um grande nada. Você já viu lágrimas vazias?Eu já às vi e não gostei. Crua como um filhote dentro de um ovo, quase quebrando a casca, mas não querendo sair do ovo. Crua como uma semente que começará a fincar suas raízes na terra.
É inútil, tento fazer minhas palavras compreensíveis. Mas como?Se nem eu as entendo. Você já viu quando uma criança acaba de conhecer um estranho?O jeito que ela analisa-o, olhos arregalados, comendo cada gesto que você fará. Estática. Analise crua, psicologia de criança. Estou tal como uma. Olhos arregalados comendo seus gestos. Sacie-me!
Manuseio um prego e um martelo, batendo com força, cravando minhas palavras em uma parede. As pessoas tendem a ficar nulas, debaixo de suas quatro paredes brancas. Eu confesso minha vida nelas. Essas mesmas pessoas sentem aroma até em flor postiça.
Pelo que  disse, excomungaram-me. E agora sofro por minhas confissões coletivas. Minha pele está sendo trocada a sangue frio, querem que nasça no seu lugar uma mais delicada, e sensível a toque humano. Começa a reencarnação de um corpo ainda vivo. E agora o que resta?Um bebê faminto enrolado em um cordão umbilical. E uma missa de sétimo dia.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

A noite de Oliva-verde

Acordei surda, na madrugada as glândulas salivais eram virgens, e meus olhos estavam cansados como em um enovelado de lã velho. Meu coração bombeava o sangue ainda quente, acordei como se saísse de um coma. Estava em coma?Se estivesse não queria despertar, gritei ninguém me escutou.
Estava transpirando e meus cabelos molhados comprovavam isso. Era suar cáustico. Mas meu corpo estava frio. Ofegando, escutei um barulho de pingo que caia na pia, e vinha do banheiro, ao lado do meu quarto. Contei quanto tempo um substituía o outro, e via o outro que substituía o primeiro. Foram três segundo, a gota durava isso e morria. Morria?Ou entrava em coma?
Alcei, fui atrás das gotas, minha cama estava encharcada, não trocarei as cobertas. Entrei no banheiro e a luz branca me ofuscou a visão. A primeira aparição foi de um reflexo no espelho. Meu rosto tinha algo químico, fechei a torneira. Agora lhe darei uma imagem: O escuro e o ponteiro do relógio, um grande, e um pequeno vermelho o que contava os pingos.
Os meus pés estavam sujeitos ao chão. Peguei uma caneta que era negra. O que te escrevo é negro. Sentei na cama contraindo meu corpo, tive um sonho, uma abstração, minhas palavras estão soltas em uma desordem, como se fosse uma fita sem editor. Eu sou o editor. Olhei o relógio com tal desespero, sei o que o especialista de sono me recomenda: “durma oito horas por dia” negarei o pedido e saldarei amanhã.
A doce insônia é algo que me aflige, peguei um livro de ciências, pois isso é a única coisa que trás sono. Abri em uma página que descrevia: “Dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço ao mesmo tempo”. Em seguida fechei o livro, pois sou a própria contradição da Física, tenho dois corpos que ocupam o mesmo espaço, eles se fundem em um “eu tu”.
Às vezes tenho excesso do “tu”, pois tenho no sangue o DNA que não é meu, é intruso. E isso me faz lembrar o que vi ontem, dois pássaros que voavam por entre o entardecer, estavam tão próximos que pareciam um só. Eles tinham o mesmo DNA?Não sei. Sei que nem os pássaros e nem eu cremos na lei da Física. Fiquei suspensa, fui abduzida pelo meu “id”, começo a ter impulsos animalescos,não tenho,sou. Não quero devotar o meu “superego” e recalcar meus desejos. Deixarei então o aroma afrodisíaco que meu corpo expeliu, para que você o sinta em forma sólida, formas de letras.
Vou preparar um chá, ligando o fogo e colocando água no recipiente. Entrei em transe, uma orquestra de pensamentos, do qual os violinos possuíam corpos humanos, o volume acresceu começando a ficar ensurdecedor. Dou-lhe a segunda imagem: Estou sentada na mesa e no fundo da tela você pode ver a chaleira. Crio então o primeiro pseudônimo para o que estou sentindo chama-se Psysis. Sou o pseudônimo, tenho a physis. Serei a physis? O chá...
Manuseio a xícara ela queima minha mão, é erva-doce. Doce. Pingou no papel, o pingo foi crescendo até que tomou de conta das duas linhas, não tentei limpar, tenho certo gosto pelo acaso. Procuro o barbante para terminar esse tricô. O barbante é a coragem. Mas não ligarei a televisão tenho pena do japonês. Preciso da arte de suas palavras, pois é a própria existência coletiva.

 Assentei minhas mãos nelas, e comecei a ingeri-las, li alto para que a lua me acompanhasse. Acho uma injustiça quem  ler em pensamentos, não deixando  que os móveis  escutem não deixando os ouvidos aplaudirem.
Começo ver a coloração que minha pele sofre conforme estou lendo as pequenas linhas. Pecarei se não as escrever aqui?
Por egoísmo de meus ouvidos, não descreverei. E então completarei: Eureca, Eureca não era só um ciclo era pura “maiêutica”.
[...]

quinta-feira, 1 de julho de 2010

A mulher de Tupperware.

                                                                                                                            À Polyana Dias e sua fé, que em meus vôos transcendentais, encontro o ninho grávido.               

                                                                      
Andava por entre ladrilhos, o meu traje era epiderme desnuda entre brechas e cortiço procurava meus poemas, as ruas eram desalinhadas fazendo-me bombear como em um trapézio. Por entre elas viam-se jornais velhos e imundos, inundados de historias, imundos.
A iluminação era dada pelo orvalho, quase bruto, quase mudo só orvalho. E ao caminhar pelos labirintos noturnos da cidade ouvia-se a televisão ligada provavelmente no menor volume possível, mas o silêncio era tanto que fazia a TV chiar. Pessoas com insônia?Viço a dizer que elas estão dormindo e a TV ligada para o nada. Fazendo propaganda da insônia.
Entrei por várias ruas, me fiz orgânica e inorgânica. Vendi minha moral. Fui juíza de uma alma que condenei. Fui ao exílio da flor vermelha, e aplaudi de pé, pois ela rouba a cor de outras, que gritam a desigualdade das pétalas. Não é casto merece a guilhotina.
Fiz a curva que me deixou plainar em uma bela arquitetura de janela grande e amarela. Fixei meus pés, admirando-a. A casa era iluminada por uma lamparina um tanto celeste, roubando o brilho lunar. O amarelão úbere da janela, das chamas da lamparina e agora o meu.
Não sei o que significa amarelo, mas agora acho que tudo é desta cor, pois ela me toma. Meu coração bombeia o sangue amarelo. Busquei na memória algo que tivessem me descrito em amarelo, e lembrei-me do: ”Amarelo de medo”. Então meu medo tem cor, a cor da janela. Analisei a cor do meu medo de frente e flertei, achei-o formoso. Mas tinha medo na janela?Não só tinha a cor. Interrompi meu pensamento, observei uma sombra, que já não era mais sombra. Vi a galhardia de uma criatura, ela vestia ventura. Que senhora era aquela?Seus cabelos eram brancos, a mocidade havia abandonado-a. Era o efeito trágico da velhice!
Eu me pus diante daquela mulher, ela manuseava um círio que iluminava os compartimentos por onde passara,dando fertilidade aos móveis já empoeirados. Seus passos eram tão firmes, que ao tocar o chão fazia ranger, parecendo árvore amadurecida, com suas velhas historias.
Por isso o chão de madeira fazia tal barulho, contava historias, dos pés e dos passos. Finalmente ela apareceu na janela, olhando para o lado de fora, e o poste que piscava,consegui ver as linhas de seu rosto, rugas que conversavam entre si, e apareciam ao franzir da testa, mostrando uma preocupação. Será que esperava alguém?Sua prole?
Ela estava lá equilibrando o corpo velho sem muleta. Seus olhos eram fundos e azuis, como um fundo de um oceano, sem peixes, sem algas, ou tubarões, só oceano. Mergulho no mar e vou ao fundo, sem oxigênio, sou vitima inocente das entranhas dessa velha. O mar não tinha ondas era pós-lépido. Vi que ela fora ao encontro da cadeira de balanço, sentou, seus ossos agradeciam. A cadeira fazia um movimento robusto, despindo-se nas horas, indo e voltando, indo(...)
Os olhos quase fechados, quase abertos se entregando ao ventre dos sonhos. A lua observava à velha, caindo em sonolência profunda. Coloco em penhor tais minhas palavras. Tenho divida com a velha. Talvez retorne para conhecer o piso que conta historia.
Não encontrei meus versos mesmo assim terminarei: Esculpindo as palavras no corpo daquela mulher.