sábado, 3 de janeiro de 2015

Seremos felizes com outras pessoas?


Isso não é sobre você. Isso é sobre mim. E reformularia até “Seremos felizes que nem outras pessoas?”. E confesso. E confesso que rasguei metade das nossas fotos, confesso que não satisfeita joguei grande parte numa fogueira, num ritual particular xamânico, confesso que joguei alguns de seus presentes pela janela, mas não tive coragem de jogar os livros. Mas confesso que fiz tudo isso ouvindo no repeat por centenas de vezes “how deep is your love” e que alguns meses depois comprei um álbum para o resto das fotos. Confesso que nunca falei sobre toda nossa história para nossos amigos, só falei o quão foi cruel em me deixar sozinha num feriado, como era rude, atrasado, era necessário que me alimentassem e me voltassem contra você, involuntariamente o fiz. Confesso que as pessoas me parecem bobas. Existe uma espécie de “poder inconsciente” que elas acreditam de verdade. Sempre acabam numa decisão de quem quer ser caça ou presa, exibem suas dialéticas tediosas e pedantes esperando impressionar alguém que já tem sua audição adulterada pela décima quarta dose de vodca. O que eu queria dizer, o que eu gostaria de dizer, de verdade, é que eu sinto sua falta. Todos os filmes me lembram de você. Acabei de assistir “Deprisa, Deprisa” do Saura, sinto falta dos seus cabelos castanhos passando por meus dedos enquanto você faria uma observação que eu não concordaria.  Eu até comecei à ouvir sua banda favorita, e acabou se tornando minha banda favorita também, claro, depois de ter ouvido centenas de vezes.  Confesso que no último carnaval que passamos juntos eu já sabia que estava com as malas prontas, sabia que você estava indo, por isso todos aqueles vídeos e todas aquelas fotos que fiz de... Nós? Mas uma morte anunciada não dói menos que uma fatalidade, sim? Queria dizer que naquele dia santo, naquele santo dia em que você corria atravessando o sol, sorriso gigante, pés no mato, pés descalços, sua alma aberta e seu coração de pouso. Um lindo quadro de humano morto pintado pela natureza. Confesso que você é a melhor pessoa do mundo. Que foi o abraço mais apertado que recebi. Que foi melhor cuidador de cólicas menstruais. Que foi o melhor parceiro de jogos. E o pior de dança. E sabe qual a melhor coisa? Eu nunca precisei fingir. E algumas vezes me pergunto será que não foi por sermos verdadeiros demais que morremos um para o outro? Passou tanto tempo e ainda não sei o que aconteceu. Mas como o tempo passou e me passou também. Passei por aqui só para recordar que tenho que seguir. E me seguir.

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