quinta-feira, 3 de outubro de 2013

zumzumzum

As mosquinhas e suas asas dominam o tempo
Nesse seu voar invisível aos olhos,
Ao cururu resta uma missão
Arrotar milésimos
De sua turva distração.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

A última conversa com meu Velho.

Debruçada sobre sonhos remanescentes. Cobria os pés do frio, mas naquela época do ano já não fazia inverno. Introjeção dos medos que se voltara para infância. Injetou em si que algo perigoso podia tocar-lhe os pés à noite.  São quase cinco da manhã, é preciso nascer. O dia acorda sonâmbulo. Aluando-se. Estive vagando por meus sonhos, nele avistava um velho sentado de bruços sobre a mesa do bar. Enquanto me aproximava vivia uma leve sensação de familiaridade. Não havia ninguém no bar fora o velho. Na mesa de sinuca tinham tacos e algumas bolas não encaçapadas como se alguém tivesse desistido do jogo. Tocava um bolero... Não sei dizer de quem, ou qual era, mas é música de fim de festa.  As batidas assemelhavam-se com sinos anunciando os sete anjos do Apocalipse.  Aproximei de sua mesa, seu bafo de cachaça harmonizava com a música do Apocalipse. Afastei a cadeira e sentei, na mesa tinham bitucas de cigarro e um copo meio vazio de pinga. Seus cabelos eram tais como brumas, tão brancos quão penas de gansos. Havia um começo de calvície no centro de sua cabeça e seus dedos eram enrugados e suas unhas sujas. Ele tinha sinais de cor marrom em todo seu braço, sua pele era visivelmente áspera. E eu indagara cá com meus botões “Quem abandonou este velhote?”. Ele tossia forte, tuberculoso. Jogou seu corpo para o lado e deu um escarro. Defronte ao seu rosto senti que o conhecia.  Mas de onde, onde. Eu o abandonei? Recalquei-o e o larguei no limbo do esquecimento?
-“Me serve”
-“Me serve, caralho”
Suas palavras eram soltas e bêbadas e quase se entalavam ao sair. Ele me olhara e seus olhos eram o rio de Aqueronte. Como se mirassem apenas algo como o suplicio.
“Você é apenas mais um. É mais um que vem aqui para me arrastar ao inferno. Eu já mandei o recado. Eu não sou nenhum merda. Você tem cheiro de enxofre e não vai conseguir me tirar daqui, não sou nenhum merda”.
Ele abandonou.  O que os vermes fizeram com ele? Esse asfalto todo, esse excesso de luz, essas pessoas insignificantes. Esse tempo de maldição.  Por qual o tirara? Eu não sabia com quem guerrear por. Não podia o levar. “A vida é uma bosta, minha filha, se leve daqui. São três quilômetros até a próxima estação. Você não tem foice, não é uma larva. Guia-se daqui. Vai-te-embora.” Afastei a cadeira e me levantei, naquela mesa vi de relance uma foto de mulher que, Deus, era tão familiar.
Cinco da manhã. Nasce o dia. Sinto meu rosto molhado. Não poderia ser das goteiras, pois não estava na estação do inverno. A vida, meu velho amigo, possivelmente é uma bosta, mas com momentos de belas bostas.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Ferreira enjoadinho

Sobre os bancos da Praça do Ferreira
Mascado o fumo
Cocei o saco
E pensei
Pra que tanta pressa, meu Deus, para quê?

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Velho

Sentou-se no ônibus, seu bafejo emanava sobre a janela que embaçava paisagem. Uma cobertura de fumaça e o sopro de cachaça era o que no final do dia se habituara.  A realidade é a coisa mais dura sobre os olhos de um velho bêbado.  Sentia falta de plantar feijões no copo. Dormia sobre os golfos das lembranças do Nepal.  Os graves das gargalhadas são dessas coisas que mudam quando a carcaça do corpo envelhece.  O ônibus corre tanto nessa avenida escura e eu não tenho pressa alguma. A minha vontade é de continuar rodando por entre os becos e as ruas sujas dessa cidade, pernoitando sobre as pernas das prostitutas e admirando a bruma da lua.

quarta-feira, 5 de junho de 2013

O paradoxo da borboleta




Sentou-se ao meu lado. Sua aparência franzina, seus cabelos avermelhados e suas sardas que pulavam tal como granulados coloridos eram as únicas coisas que eu conhecia dele. Além dos olhos que de certa forma me lembravam aos de uma Orca. Sabe, gostaria de poder descrever quão forte é a sensação de um ser te mirar com os olhos de Orca. Certa “OniImpotência” me tomava o corpo. E quando termino de relatar tais pensamentos surgiam suas primeiras palavras:

- Desde quando existem as borboletas? Perguntou-me.

Sinto imediatamente à gastrite retalhar meu estômago.  As malditas pessoas deste ônibus não sabem o que está acontecendo? Ou estão apenas sendo simplesmente levadas a qualquer lugar?
Respondo-o.

-Desde que nasci elas sempre estiveram aqui.

-Ah, então são eternas.

Ele respondeu com um ar de quem não havia sido surpreendido.

-Não sei se são eternas. Mas são eternas para mim, desde que nasci elas existiam e vão continuar existindo mesmo depois de minha morte. 

Seus olhos de Orca agora estavam como se fossem dar o bote.

-Sempre existirá algo antes de você e continuará existindo mesmo depois da sua morte. É assim que vai ser.

Termino meu pensamento. Ele parece não estar interessado. Fica olhando para janela procurando alguma coisa. E assim me diz...

-Será que a borboleta cansada de voar e fatigada de conhecer o eterno. Certo dia de sua vida a única coisa que ela desejaria não seria voltar para o seu casulo e tornar a ser lagarta, sendo assim protegida pelo quentinho de sua casa? Acho que toda borboleta certo dia de sua vida sente uma falta danada da época em que era lagartinha. 

Retruca-me.
Aí minha gastrite!